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domingo, 16 de agosto de 2009
DONO DE CASA
Durante dez anos de namoro Gilberto fez o gênero romântico com pinta de ator do Globo, apenas para impressionar a tonta da Janete.
Era o fofo do século, se enfiando em dívidas e mais dívidas somente para não deixar faltar um presentinho mimoso no final do mês, caixinhas de bombons durante a semana e uma viagem surpresa para comemorar o aniversário daquele amor eterno.Que homem maravilhoso!
A mulherada da redondeza morria de inveja, se corroendo aos poucos pela sorte grande de Janete. Os dois pombinhos viviam em festa, atiçando o olho gordo da galera que achava mesmo Gilberto um fenômeno nacional.
Já não faziam mais namorados como ele...E antes mesmo que o príncipe encantado se transformasse em sapo, a bonitona resolveu lhe colocar na parede:
- Ou casa ou some.
Gilberto não tinha família por perto, vivia num quartinho de pensão e ganhava somente para seu próprio sustento. Coitadinho, o salário de vendedor de livros apenas lhe dava ao luxo de passar a vida inteira meio minguado.
Então não tinha nada a perder e Janete poderia até lhe render um lucro. Ela sempre foi muxiba e com certeza tinha lá suas economias, podendo lhe dar uma força no orçamento da casa.
Gilberto topou na hora.Pronto, estava compactuado o golpe do baú para cima daquela sonsa.
Janete ficou deslumbrada com a simples idéia de dividirem o mesmo espaço.Que romântico!
Enquanto a pobre moça ralava o couro para dar conta do recado, o outro ralava o couro fazendo Cooper na praia.
Que dureza! - reclamava, dizendo se sentir muito deprimido por precisar tanto de um apoio moral da própria mulher.
No começo Janete enchia os olhos d’água, lhe fazendo um cafuné no cangote.Depois servia uma bebida para descontrair o bebezão, um almoço vitaminado e um trocadinho para que ficasse mais alegre.
Janete virou um palito de gente enquanto Gilberto engordava como um leitão a pururuca.Até comprou um kit verão, com direito à sunga, óculos de sol e um isopor para a cerveja.No passado ele vendia livros, era um fofo e lhe cobria de mimos, mas agora tudo mudou.
O homem era outro, minha gente! Parecia que tinha virado ao avesso.Agora morava na praia e só aparecia quando a barriga começava a roncar de fome.E chegava armando o circo, se acabando na ducha. Comia de baciada e roncava na rede da varanda sem ao menos reparar nas olheiras profundas de Janete.
Só que cada mulher tem bofe que se permite merecer.Esta época de se fazer de tapete para o boneco desfilar, ó, é uma história antiga.Hoje em dia o enredo é outro e ACORDAAAAA MULHER!
Ame quem lhe ama, quem lhe respeita e quem lhe dá valor. Aliás, o seu mundo caiu!
Ê Gilberto pistoleiro! Já estava passando a hora de lhe dar um corretivo.Então olhou no relógio; eram duas horas da tarde e o gostosão deveria estar pegando uma onda...
Ela olhou ao seu redor e se viu totalmente perdida com os afazeres domésticos: casa, comida, roupa para lavar...
Lá fora tava um sol de estourar pipoca. Ela colocou um maiô colorido, um chapéu de palha e uma revista embaixo do braço, indo á procura de um relaxamento completo.
Nem lembrou que Gilberto deveria já estar sentindo aquela fominha básica. Nem pensou em nada; da louça empilhada na pia, no serviço doméstico.E curtiu pra valer!
Quando chegou o finalzinho da tarde, com o corpo moído de tanto pular onda, deu de cara com a cara “passada” de Gilberto, que de sunga mesmo tirava o lixo da casa com uma mão e colocava a panela no fogo, com a outra, mas satisfeito por conseguir pegar um bronzeado poderoso no forno.Porque na verdade todo homem folgado adora uma mulher que o coloque no seu devido lugar: no tanque, na pia e no fogão.
Silmara Torres Retti
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